Com os problemas dos anos anteriores, a principal preocupação da Diretoria de Turismo e Certame da Prefeitura, para o carnaval de 1957, foi a organização dos desfiles. Para isso, a primeira medida foi transferir as apresentações das escolas de samba da Avenida Presidente Vargas para a Avenida Rio Branco. Além disso, uma equipe valiosa de técnicos foi contratada. Essa tentativa, no entanto, não foi muito bem sucedida, a começar pelo atraso de 3 horas para o início das apresentações, antes previsto para as 19h30min. Demora essa que desgostou até mesmo o prefeito Negrão de Lima. Ocorreu simplesmente que os principais representantes das escolas de samba sequer foram chamados para opinarem sobre o assunto.
Sem Medo de Desafio
Como se já não bastasse a grande e natural rivalidade entre as duas - já na época - mais representativas agremiações do subúrbio da Central, Portela e Império tinham temas semelhantes nesse ano, o que foi um tempero a mais no carnaval de 1957. No período pré-carnavalesco, já se previa uma especial disputa entre elas. E a Portela não fez por menos. Sendo a décima escola e a última das “quatro grandes” a desfilar, ela ocupou a avenida por volta das 3h30min da madrugada de segunda-feira, não repetindo os erros apresentados por Império e Mangueira, que haviam desfilado desorganizadas e mudas. Tendo como grande trunfo o ótimo samba de Candeia, Picolino e Waldir 59, a azul-e-branco de Oswaldo Cruz, ao contrário das rivais, cantou e evoluiu ao longo de toda a avenida, não somente em frente à Biblioteca Nacional, onde estava a Comissão Julgadora.
Outro ponto alto do seu desfile foi o desenvolvimento do enredo “Legados de D. João VI”. A escola levou para a avenida vários carros. Seguindo o abre-alas, uma comissão de frente com 15 membros elegantemente vestidos. Depois, um carro fez referência à chegada do príncipe regente ao porto da Bahia. Logo após o casal de mestre-sala e porta-bandeira, foi lembrado o primeiro ato assinado por D. João VI ao chegar ao Brasil: a abertura dos portos. Os portelenses ainda saudaram a considerada emancipação econômica do país e o desenvolvimento das ciências e das artes.
Sempre organizada, a Portela desfilou com todos os seus 1.200 componentes devidamente fantasiados. Suas alas foram as seguintes: Acadêmicos, Impossíveis, Diplomatas, Silêncio, Baluartes, Mocidade, Embaixadores, Compositores, do lado masculino; e Nobreza, Impossíveis, Acadêmicas, Diplomatas, Silêncio, Baluartes, Mocidade, Embaixadoras, Baianas Ricas, Vaidosas e Filhinhas, do lado feminino.
O Segredo de Mestre Betinho
Experiência, astúcia e segredo. Foi assim que o mestre de bateria da Portela conseguiu surpreender público e jurados no carnaval de 1957. Mestre Betinho teve, à última hora, a idéia de fazer uma fantasia original para seus 120 homens (ele havia dobrado o número de ritmistas do ano anterior para fazer frente, com êxito, aos 210 do Império Serrano).
Para quebrar a seqüência de vitórias da Serrinha, ele próprio imaginou o desenho e mandou fazer 600 metros de lonita. Quinze dias antes do desfile, ele fez seus ritmistas provarem, de olhos vendados, suas fantasias no alfaiate, exigindo deles absoluto segredo. No domingo de carnaval, ele trabalhou de nove às cinco entregando fantasias. O resultado foi notável e a bateria da Portela, muito bem fantasiada, foi um autêntico sucesso. O conjunto da Portela esteve afinadíssimo, com uma cadência e uma evolução primorosas. Foi considerado por muitos o mais perfeito já visto em escola de samba até então, deixando entusiasmados público, juízes e autoridades, e merecendo parabéns dos próprios competidores.
Seu desfile foi tão magnífico que encantou o cinegrafista francês Sacha Gordine, que colhia material para a versão cinematográfica da peça “Orfeu da Conceição”, do poeta Vinícius de Moraes. Imagens do desfile da Portela estão eternizadas no filme “Orfeu do Carnaval” (de Marcel Camus e produção de Sacha Gordine), ganhador da Palma de Ouro em Cannes (1959) e do Oscar de filme estrangeiro. Vale pelo diálogo entre a beleza do povo carioca, em desfile, e uma bela fotografia da cidade do Rio de Janeiro.
A Portela terminou sua apresentação como a mais provável campeã. Dias depois, a Comissão Julgadora, formada por Mozart de Araújo (músico), Édison Carneiro (escritor), Solano Trindade, Iberê Camargo (pintor) e Alceu Pena (figurinista), confirmou a impressão geral e deu a Oswaldo Cruz mais um campeonato, com 103 pontos e uma quantia em dinheiro de Cr$ 30.000,00.
Fontes: Revista O Cruzeiro, Jornal Correio da Manhã, Jornal do Brasil, Jornal O Globo.
Equipe Portelaweb - 2006
Texto revisado por Fabrício Soares
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